O Ministério da Saúde Adverte: Contar Histórias faz muito bem a Saúde
Artigo de Luciana de Mattos Tenório, psicóloga e contadora de histórias. Contato: luciana_tenorio@hoA Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde como o estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não meramente a ausência de doença. Ao ampliar esta visão, dissociando do modelo exclusivamente médico/doença para entender que o sujeito está inserido em um contexto, que o determina e é determinado por este, esta falando também de cultura, meio-ambiente e vida social. O estilo de vida precisa ser levado em conta para que se entenda o sujeito como um todo e não fragmentado em especialidades. Quando alguém adoece não apenas aquele foco especifico de sua doença está atuando neste indivíduo mais todas as questões psicossociais que ao mesmo tempo estão interagindo nesse momento da vida da pessoa. A tradição oral, ou seja, a forma de estabelecer comunicação via palavra dita, seja em que meio for (rádio, orador, linguagem de sinais, televisão, filmes, teatro) é o objeto de observação deste ensaio. A intenção é pensar como a tradição oral interage com esse conceito de saúde definido pela OMS. Ao nascer uma pessoa esta necessariamente está conectada ao mundo, a outra pessoa. O ser humano não se desenvolve ou sobrevive sem a influência cultural. Este ser já nasce com uma história desde pelo menos o momento em que é fecundado. Alguns tem essa história ainda mais ampliada, como é o caso das crianças amplamente desejadas e planejadas para nascer. Em algumas famílias e culturas existem crianças que antes de serem geradas já estão prometidas em casamento a outra pessoa e até mesmo a nossa existência é registo em carne e osso de milhares de pessoas atrás de nós que nasceram, se desenvolveram, tiveram filhos e morreram. Então, sobretudo os contos de primeira infância, ou seja, as narrativas que vão servir de alicerce para o desenvolvimento da criança, são determinantes no adulto que essas crianças serão um dia. Aprendemos ao longo da vida quem somos pelo que os outros nos dizem e aos poucos vamos criando novas fontes e constituindo a singularidade de cada ser. Não é interessante? Ao mesmo tempo em que somos constituídos por nossa comunidade, somos únicos ao nascer e ao longo da vida. Essa parece ser a grande dinâmica que vai nortear todo processo de crescimento em sociedade. O ser humano morre por falta de afeto e amor. Muitas vezes, a fragilidade física gerada pela miséria, pelas faltas de condições minimamente dignas de vida também ajudam a piorar isso, mas encontramos pessoas muito bem nascidas e com boas condições financeiras e que também estão adoecidas por falta de amor. O que é a baixa auto-estima se não uma dificuldade imensa de se sentir querido, amado e desejado pelo outro e por si mesmo do jeito que se somos. O sucesso pessoal, profissional, adaptativo e criativo vai ser muitas vezes determinado pela qualidade de afeto, acolhimento e troca nas diferentes fases da vida. Um meio estimulante, por tanto, não está necessariamente ligado a recursos financeiros ou classe social, mas sim, ao esforço de cuidado que uma criança recebe e que vai ser um alicerce ao longo de sua vida. Contar histórias é um ato de troca. Quem conta sempre está num momento de comunicação. Está sempre em interação com o outro. O contador precisa que o outro escute o que você conta e não é possível o contar sem isso. Isso se difere até da leitura pois está pode algumas vezes ser um ato individual. Além disso, é uma atividade acalmadora que exercita a concentração e o ato de ouvir. Ajuda aumentar o vocabulário e atiça a curiosidade por buscar novas histórias. Mas essa narrativa, não é um dizer de qualquer maneira, mas um dizer que precisa necessariamente provocar o imaginário e a fantasia. É também um potente instrumento de estímulo a leitura, pois ao ampliar o universo imaginário através da palavra oral se cria a base para que isso também seja decisivo quando o sujeito aprende a ler. Aprender a ler, significa nesse contexto, aprender que um livro registra uma história, que está além de suas linhas e que se inicia muito antes do processo de alfabetização. Só assim, o livro passa a ser vivo e passa a efetivamente a dar prazer ou provocar sensações. Se não conseguirmos provocar as sensações através das palavras não conseguimos gostar de ler. Hoje no mundo globalizado, adoecido e massacrado que vemos por ai, é de novo o universo das histórias que podem nos ajudar a dar voz aqueles que precisam falar. Todo mundo, mesmo antes de nascer, já esta contado histórias, sendo personagens e ouvindo histórias e assim vamos ficar até o fim dos nossos dias.
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