Quinzenalmente teremos uma crítica teatral assinada por Maria Helena Kühner. As opiniões do crítico são totalmente independentes do julgamento de valor do CEPETIN, que tem outros membros avaliando os espetáculos. As opiniões, portanto, podem ser divergentes e é desta divergência que pode surgir uma dicussão profícua.
Arquivo de Críticas
A Lenda do Príncipe que tinha Rosto
Um espetáculo da Cia de Teatro Artesanal é sempre gerador de boas expectativas, dado o nível de qualidade de seus trabalhos. Mas, desta vez, saíamos de lá um tanto frustrados.A idéia central - o fato de ter rosto ser causador de uma diferença que gera estranheza e leva ao isolamento - é interessante e provocativa (sobretudo em um tempo em que a massificação é crescente, diria um espectador adulto). Como são provocadoras as cenas iniciais, com seu belo videografismo e o clima insólito criado pelas figuras em negro, sem rosto, movimentando-se pela cena, enquanto um play back introduz a história que, ao que se supõe, vai se desenrolar.Mas é neste desenrolar que a peça vai revelar sua fragilidade maior: a opção da Cia., de “não dar prioridade” ao texto, no caso parece tê-los levado a deixar de lado a escritura dramatúrgica, reduzindo-a a essa narrativa em play black que vai se revelando falha e desconexa: o pequeno príncipe é isolado do mundo pelo insólito fato de ter rosto; mas a “pequena ama” que vai surgir também tem rosto e, ao que parece, convive normalmente com os demais no mundo fora; decidem fugir juntos e em outra cidade vão encontrar antepassados também com rosto ( como, por que? ); resolvem então voltar (?) e...dá-se um arremate da trama que soa brusco e forçado: “Acabou...?” perguntou, cada vez mais atônito, um menino de 10 ou 12 anos próximo a nós. Levando quem assiste a supor tratar-se de um work in progresss que foi levado, ainda inacabado, à cena.Pois esse fiapo narrativo esgarçado não é suficiente nem para manter o interesse na trama, nem como suporte da escrita cênica - que vai perdendo ritmo, e tornando-se lenta, monótona, repetitiva, empobrecendo-se gradativamente até o esvaziamento final – nem como suporte para o sugestivo videografismo e a bela iluminação, que perdem igualmente sua força expressiva. Se as influências buscadas, e mencionadas, foram o gótico e/ou o cinema de Tim Burton, cabe lembrar que, em ambos, o clima insólito e fantasioso se desenvolve ou se desdobra em uma trama que mantém o interesse – e não apenas na temática em torno de facetas inéditas de personalidade. Vale lembrar Dr. Jekyll e Mr. Hyde, ou Dorian Gray, ou Frakenstein, ou, no cinema, o Edward Mãos de Tesoura, ou o Batman, e até a Alice de Tim Burton. Uma pergunta curiosa nos ficou: se antes o trabalho da Cia Artesanal trabalhava o texto como prioridade, porque, em vez de acrescentar ao que fazia, decidiu substituí-lo por outra busca que, ao que parece, menospreza o antes conquistado?Mas vale o esforço de, em um momento e meio de grande número de espetáculos que nada buscam e nada acrescentam, a Cia de Teatro Artesanal estar mantendo uma linha coerente de experimentação e inovação.
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