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quarta-feira, 31 de março de 2010

H.a.m.l.e.t.

H.a.m.l.e.t.

Roberto Alvim argumenta muito bem. Seu arrazoado sobre a dramaturgia contemporânea, num debate no festival de Curitiba, viajou de Ésquilo até Sarah Kane para afirmar que o texto no teatro serve à ampliação da experiência humana ou não é nada.
E ele deu "H.a.m.l.e.t.", título que parece remeter à "M.o.r.t.e." de Gerald Thomas, que também ecoava "Hamlet", como sua melhor peça até hoje. De volta a São Paulo, corri para ver, no Club Noir, baixo Augusta.

Não posso dizer que tenha me arrebatado ou que tenha confirmado o que as palavras do autor prometiam. A supressão da trama e, imagino, o próprio ritmo do verso branco resultaram numa peça compassada, vagarosa.

A sensação se estende, em parte, à direção de interpretação de Juliana Galdino, que estreia como diretora, como não poderia deixar de ser, com traços do que viveu e aprendeu de Antunes Filho, na voz, na priorização dos atores.

Alvim escreveu uma peça mais inspirada do que adaptada de Shakespeare. Protagonista e personagens como Ofélia e os atores são transportados para um ambiente hospitalar, como em "Cleansed".

Mas quaisquer cortes são difíceis de justificar, em "Hamlet". (Até a cena de Polônio com Reinaldo, quase sempre a primeira a cair, fazia falta nas montagens a que assisti. O efeito é empobrecedor, por melhor que seja a encenação.)

E não é diferente, com o texto de Alvim. Se Shakespeare inventou o homem, ao menos em sua versão moderna, cortar tanto assim _e manter título, personagens, algumas cenas_ deixa sensação de ausência.

(Como contraponto, encenado poucos meses atrás no Brasil, "Hamletmachine" é mais bem sucedida, com o original antropofagizado integralmente pelo universo social e estético do alemão Heiner Mueller.)

A essência hamletiana ambicionada pela peça ganhou sua melhor expressão no impacto visual, do escuro ao branco. Cenário e figurinos, da atriz tornada encenadora, Juliana Galdino, estão entre as melhores coisas de "H.a.m.l.e.t.".

Na interpretação, outra opção de impacto, um Hamlet gordo e envelhecido, não é explorada como poderia, para o bem do espetáculo. Falta, por exemplo, o humor alcançado pelo Stanley Kowalski do "Bonde" de Frank Castorf.


Escrito por Nelson de Sá às 15h21

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