*A ALDEIA*
Era um garoto ainda na inicio da Universidade, mas já exercia alguns poucos
anos de teatro, realizados no antigo Teatro Experimental do Maranhão (TEMA).
Naquele ano de 1971 rompíamos com o antigo berço teatral e montamos o Zoo
History do Edward Albee, a minha primeira direção. Com ele chegamos à Aldeia
de Arcozelo em Paty do Alferes aqui mesmo no Rio de Janeiro, e vivenciamos
uma das grandes experiências das nossas vidas: O *I Festival Brasileiro de
Teatro Estudantil. *O ano de 1971 era um dos de chumbo, ninguém no Brasil
teria a ousadia de, no Governo Médici, juntar mais de quinhentos estudantes
universitários para fazer e discutir qualquer coisa, principalmente teatro.
Somente o *Embaixador Paschoal Carlos Magno*. Antes de conhecê-lo, pelo
nome, imaginava-o como um general, não aqueles que nos comandavam, mas os
das antigas cruzadas. E era o que ele era: um líder dos templos cênicos. E o
seu único dever com a Ditadura, era não deixar ninguém da comunidade entrar
no espaço. Nós mesmos fomos o nosso público.
Paty do Alferes, distrito de Miguel Pereira era um vilarejo serrano como
tantos outros por aí. A Aldeia era um sonho concretizado em uma antiga
fazenda de café: no casarão, as suítes; na senzala: o albergue, o
refeitório, o seu teatro de bolso; ao largo, o magnífico anfiteatro grego,
circundado pelas ramas de cabelos-de-velha; mais adiante a ponte e o riacho
que corria atrás. O mês era o de janeiro, como tinha sido o do seu
nascimento e não acreditávamos como alguém poderia ter tido o ímpeto de
fazer aquilo. Para mim, ou era um louco ou um santo.
Os meninos do Brasil todo, começavam a chegar, e nós os do Maranhão. Para
ter uma idéia, a grandiosidade do evento era tanta que a premiação se dava
com os dez melhores de cada área que abrange o teatro. E rolaram nos dez
dias, cinco espetáculos por dia e em qualquer lugar da Aldeia, pois qualquer
um deles pôde se tornar eficiente para a glória das artes cênicas. Tudo
muito inesquecível. Se eu fosse falar tudo que rolou por lá tomaria muito o
tempo de vocês. Mas introduzi um pouco da história para dizer que tudo isso
ao me marcar muito me deixou um compromisso fincado à beira daquele riacho
com o grande Mestre ao centro, nos comprometendo a zelar por aquele espaço e
nos abraçarmos eternamente pela causa cultural.
Posteriormente, entre as ameaças do Paschoal de tocar fogo na Aldeia pelo
descaso diante das querelas jurídicas com a Aldeia e seu posterior
falecimento, voltou-me o compromisso que em 1990 se concretizou, já na
Diretoria da Fetaerj, ao levar o nosso festival para lá. Na presidência da
entidade, instituí o Prêmio Paschoalino, fizemos a premiação nos moldes como
o Paschoal pensava e resgatamos o que ele já delegava na época: fazer da
vida uma luta constante para construir teatros onde estivéssemos.
Hoje, completando 100 anos do seu nascimento, cada vez que me deparo com os
descasos culturais que me deixam pra baixo, busco na luta do Pascoal, a
coragem necessária para levantar buscando aquele abraço companheiro que me
faz regar a claudicante energia. Foi esse afã que me fez lutar contra tudo e
contra todos para termos teatros em todos os lugares do Estado Rio de
Janeiro e é ele também que não me deixa calar. Com tais compromissos
firmados só não me dou por realizado, pela eternamente inconformada alma
inquieta do humanismo cênico, sempre ansiosa por mais desafios para poder
sobreviver. E a Aldeia de Arcozêlo é o nosso templo maior. SALVEM-NA POR
DIONISIO E POR TODOS OS ÍCONES CÊNICOS DA HISTÓRIA.
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